Saravá!!!!

Façamos desse blog um botequim virtual. De preferência um botequim da Lapa ou de Vila Isabel, um botequim que existiu há muito tempo atrás, onde um rapaz chamado Noel sentou-se à mesa e compôs um samba acompanhado por uma orquestra em que os instrumentos eram caixas de fósforo. (Tágore Aryce)

sexta-feira, 12 de março de 2010

CARNAVAL: SESSÃO MANAUS

Tágore Aryce

É um paradoxo, mas esse blog que ousa falar de samba não tocou no assunto durante o carnaval. A explicação é simples e convincente. Estávamos todos em pesquisa de campo. Sim, viajando pra conhecer outros carnavais já que o carnaval, definitivamente, não é o forte de Goiânia. Parabenizamos quem tenta reacender a chama, mas, quando não e, não é!

Pois bem. Estivemos em Manaus durante a festa do Rei Momo (eu e Romero Arruda, os presentes na viagem e não os “Reis Momos”). Manaus tem carnaval na melhor essência da palavra. Existem blocos populares, desfiles de escola de samba, sambódromo, brincantes de todas as idades, concurso de fantasia, carnaval no sábado magro, ressaca do carnaval e tudo que está relacionado à folia.

Começamos a nossa pesquisa de campo ainda no sábado magro, dia em que sai a BICA (Banda Independente da Confraria do Armando). O bar “copo sujo” de um português rabugento recebeu 100 mil pessoas que em coro cantavam marchinhas com cunho político, esculhambando Prefeito, Vereador, Senador e quem mais merecesse.

A marchinha do ano tinha como tema os “irmãos coragem”, um Ex-Deputado Estadual (Wallace Souza, que está preso) e o Vice Prefeito de Manaus (Carlos Souza), envolvidos até o pescoço em crimes como homicídio, associação para o tráfico, entre outros. O trecho da marchinha que mais empolgava os foliões, que cantavam com punhos cerrados era:

“Irmãos Coragem é meu ovo esquerdo
Cá na Bica do Armando tá todo mundo preso.”

A folia da BICA começou às 14 horas, abandonamos o evento às 20:00, pois mais tarde havia outro ambiente a ser pesquisado. O tradicional Baile do Hawaii ocorre no espaço da piscina do mais tradicional hotel da cidade, o Hotel Tropical e teve como atração Jorge Ben. Em que pese ser um baile tradicional, já está “contaminado” pelo cunho capitalista que envolve a festa. Cambistas e ingressos a preços nada populares tiram o gostinho do carnaval democrático da cidade, mas, como ninguém é de ferro, e gostamos de farra, marcamos presença por lá.

Já no sábado de carnaval, centenas de blocos, que por lá chamam de bandas, começam a desfilar pelas ruas da cidade. Há blocos para todos os gostos, inclusive blocos de cabaré. Isso mesmo, a “casa de shows” Rêmulo’s tem sua banda, a falada e mal falada Banda do Rêmulo’s. Salienta-se que não fizemos este trecho da pesquisa “in loco”, fica pra próxima!

No sábado de carnaval ocorrem os desfiles do grupo especial de Manaus (há o grupo de acesso e o grupo especial). Os desfiles ocorrem no estruturado sambódromo da cidade. Fiquei impressionado com a qualidade dos carros alegóricos e fantasias. O desfile é transmitido ao vivo pela tevê e tem participação efetiva das comunidades. As fantasias não são caras e há venda de enredos como muito tem ocorrido no Rio. Uma das escolas falava sobre a Defensoria Pública (que assunto escroto), enfim, há uma perda de essência, mas ficar falando sobre isso também enche o saco.

Carnaval que segue, domingão. No mesmo sambódromo dos desfiles do dia anterior acontece o Bloco das Piranhas. Homens vestidos de mulher dão o ar da graça na folia do domingo de carnaval. 200 mil pessoas participam do bloco que, uma semana depois, no sábado posterior ao carnaval, realizam uma espécie de ressaca do bloco, chamado “caldo das piranhas”. Realmente, após essa maratona de farra deve sobrar só o caldo.

Outro bloco interessante é o Galo da Madrugada de Manaus. Alguns recifenses radicados em Manaus, com saudade do fantástico carnaval do Recife, se reuniram e fizeram uma filial do mais famoso bloco de carnaval do Brasil. Interessante ver a cultura nordestina se espalhando Brasil afora.

Na terça-feira de carnaval acontece o Carnaboi. Ao som dos bois Garantido e Caprichoso ocorre essa salada cultural que mistura carnaval com as toadas de boi-bumbá. A festa ocorre no sambódromo e em 2010 atraiu 80 mil pessoas que, freneticamente enalteciam seu boi. É bonito ver a paixão da população pelos bois de Parintins. Há um universo desconhecido pelo restante do País nas toadas de boi-bumbá. Vale à pena pesquisar, é cultura brasileira!

Durante a viagem conhecemos um bar chamado Chão de Estrelas. Não há bar mais surreal no meu currículo de butequeiro. Um estabelecimento pequeno e com características pontuais. Milhares de discos de vinil em conjunto com centenas de objetos antigos decoram o lugar. Os músicos tocam chorinho e samba e ficam de costas para o público, numa espécie de curral. Quem souber cantar pode se habilitar. Não há garçom no bar, o sistema é self-service. O microfone é plugado a um desses aparelhos de som que qualquer um tem em casa, como eu fazia na minha infância. O dono do bar usava uma camisa bem estampada, aberta e anunciava as atrações da noite com muito entusiasmo. Entre um anúncio e outro, o proprietário ainda controlava o banheiro: “homens pra cá, mulheres pra lá, sua vez, vez dele, vez dela.” Uma bagunça organizada.

Estivemos em Manaus na semana que antecedeu o carnaval, no período de festa propriamente dito e na semana posterior, no entanto, não conhecemos metade do que a cidade tem a oferecer no quesito folia, mas conseguimos observar o principal que é o clima de festa: pessoas pelas ruas com confetes, serpentinas e fantasias brincam ao som de marchinhas antigas e atuais, compostas por cidadãos amazonenses.

Valeu muito à pena nossa pesquisa de campo. O fígado voltou baqueado, mas tudo em nome do trabalho. É com uma pontinha de inveja, com uma pontinha de dor no coração que eu digo: Manaus tem carnaval!

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